
15-17 "O Senhor Deus colocou o homem no jardim do Éden para cuidar dele e cultivar a terra. Mas o Senhor Deus avisou o homem: “Você pode comer qualquer fruta do jardim, menos a fruta da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal. Isso porque essa fruta abrirá os seus olhos e você ficará com a consciência despertada para o certo e o errado, para o bem e para o mal. Se comer essa fruta, você estará condenado a morrer”.
“Quando era criança, era feliz e não sabia”. Quem já não escutou a frase? Invariavelmente as pessoas associam isto ao pecado, à pouca pureza ou à inocência perdida. Curiosamente tanto o pecado original, quanto o lascivo “fruto proibido” (que, sabe-se lá porque com o decorrer do tempo passou a ser confundido com a cândida e inocente maçã ) também estão ligados ao sexo. A única explicação que me vem em mente é a de que a maioria das pessoas só tem sexo na cabeça mesmo e outras, possivelmente, odeiam maçãs. Mas o que existe então de comum entre nossas infâncias e Adão? Respondo: a ignorância.
A bem da verdade a ignorância parece ser pedra de toque, peça-chave para felicidade. O bondoso Todo Poderoso, muito provavelmente, deveria ser conhecedor disto quando alertou o néscio “coma qualquer fruto, menos o fruto da árvore do conhecimento do bem e o do mal”. Aliás, se não houvesse alertado com tamanha ênfase o mais provável é que ele nunca comesse.
Conhecimento nunca é algo completamente confortável. Conhecer o mecanismo das coisas; compreender sua engrenagem; a forma com que são engendradas não é para qualquer um. Pensem se você saborearia com o mesmo entusiasmo seu prato predileto se soubesse como foi preparado naquele restaurante ou se continuaria a ser um cidadão respeitador das leis se conhecesse os reais interesses de deputados, senadores e vereadores no momento de quando as criaram.
Na infância ocorre mais ou menos algo semelhante ao jardim do Éden. Somos tão ingênuos que acreditamos em tudo que nos dizem sem sequer duvidar. Acreditamos que nascemos trazidos por cegonhas; que ganhamos presentes do papai-noel e coelhinho da páscoa; que o mundo é bom e as pessoas são boas.
Mesmo após crescidos, muitos, por covardia ou preguiça escolhem não conhecer, afinal, como dissemos, o conhecimento nunca é confortável.
Conhecer, em última análise, implica, assim como Adão, em questionar, transgredir, violar, romper com, caminhar com os próprios pés. Tanto o pecado de Adão quanto seu próprio castigo foi tão-somente um e exatamente o mesmo: conhecer como realmente as coisas são, e, reconheçamos, isto é fardo demasiadamente pesado.
Anatole France com sua crítica sempre arguta e refinada escreveu: "A ignorância é a condição necessária da felicidade dos homens, e é preciso reconhecer que as mais das vezes a satisfazem bem”. Mas não precisa ler “os deuses têm sede” para se chegar à mesma conclusão, basta perguntar a qualquer guri que assistiu ao filme “Matrix” que ele te responderá “A ignorância é uma bênção”.
Ainda outro dia morri de inveja quando encontrei um casal de amigos, felizes a mais não poder, comemorando sua estupidez. Mas não me engano: conhecimento é processo irreversível. Aberta a caixa de Pandora não há mais como fechar os olhos e retroceder aos tempos felizes e tranqüilos de alentadora ignorância tal qual o casal de amigos. É Adão, éramos felizes e não sabíamos.
A cada dia me dou mais por convencido de que a coisa é sintomática: dom da felicidade é exclusividade dos idiotas. Pelo menos dos adultos. Vou incluir nesse rol também as mães (mãe é mãe né)
Se é certo que só os idiotas são felizes, oxalá ainda nos reste ao menos alguns breves momentos de estupidez.