segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Sonhos esquizofrênicos de Alice


Ela me entorpece com seu ópio, meus dentes rangem, minha boca seca, meu coração dispara frenético e descompassado. Em cada beijo parece me enfiar na boca doses de anfetamina.  Cada palavra sua me convida a perder-me ainda mais atrás de um coelho branco fugidio. Eu por outro lado lhe ofereço o precipício, antídoto para a sua vida de comercial de margarina, afinal a imperfeição é algo demoniacamente sedutor. Em seu mundo nonsense eu não sou real, ora personagem cafajeste saído de algum filme noir; ora malandro cantado nalguma música do Chico; ora Romeu shakespeareano. Não me importo. Se entre uma fumaça e outra de meu cigarro e algumas palavras ao pé do ouvido ela faz questão de mostrar-me o quanto eu a deixo molhada, de que me valeria tanto a tal realidade? Não, meu castelo são escuras masmorras; meu trono é ambulante; minha eternidade é furtiva; meu gozo é mudo. Ela me diz que aqui eu sou El Rey, enquanto eu, titubeante e sem ter o que dar em troca, lhe ofereço minha patética fidelidade de mundo real. Definitivamente não somos convencionais. Se em seus dedos brilham esmeraldas, diamantes e rubis de pouco vale tudo isso aqui em seu mundo de fantasias. Talvez sua máscara de colombina reluza mais que todo o ouro de Salomão. Ah como o relógio dos amantes é prodigioso, transforma minutos em horas e horas em segundos. Alice me pergunta, assim, de supetão como se anunciasse o final do mundo, o que faria se tivesse poucos dias de vida. Digo que viveria cada minuto de forma a trazer comigo os breves átimos de felicidade. Respostazinha capciosa mas sincera. A mais pura sinceridade cínica dos cafajestes. A mais ingênua sinceridade cega dos enamorados que diante da beleza do precipício esquecem por completo a dor da queda. Não lhe ofereço rosas; não a levo de mãos dadas ao cinema, tampouco o happy end das comédias românticas. Possuo a estúpida liberdade dos tolos. Bêbado, olho as bundas sem culpa ou remorso. Ela complacente, finge me entender. Sou Ulisses acorrentado imune aos canto das sereias ou Werther com as pistolas em punho, pronto a estourar os miolos? Não sei, em seu mundo ela é a tirana cujas regras me impõe. Por vezes sou o adolescente imberbe com suas poluções   noturnas sonhando com a garota da escola. Em outras me pergunto se seria verdadeiramente feliz se a visse de bobe nos cabelos vendo a novela das oito. Temerosa da resposta ela se pergunta se seriam meus os olhos de tragédia anunciados pela boca de Cassandra. Eu sei, mas não respondo, apenas sigo dançando conforme sua música, mas ah, como é doce essa melodia. Que me importa com quem está a batuta? Como esposa ciumenta segue todos os meus passos e me pergunta dos amores passados. Como loba esfaimada cheira minha roupa e com os olhos embotados diz que com sua boca quer me saciar. Se escrevo quase a expor minha musa é tão -só porque todos os apaixonados são em essência vaidosamente exibidos, fazem questão de falar aos quatro ventos da pessoa amada.Não pretendo decifrar os mistérios do amor e nem antever o tempo dos amantes. Apenas vivo, vivo,vivo, enquanto Alice segue construindo o nosso mundo onírico.