Não pense reconhecer em minhas palavras qualquer traço daquele sentimento vulgar que inspira àqueles que desdenham o que não lhes pertence mais. E se te desejo que naufragues no marasmo de uma vida sem sentido e cercada de frustrações é apenas porque isto me parece o rumo natural das coisas.
Não julgues também confundir este meu desejo secreto com a obviedade das lágrimas piegas que choram os desconsolados pelo amor não correspondido. E se ainda dou-me ao trabalho de rogar estas últimas imprecações extemporâneas é tão-só porque minha pena segue ferina e afiada e minha voz, há muito abafada na garganta, não vê a hora de sair, ganhar o mundo e tão-somente por isso elegi você como tema.
Tampouco confunda minha pequena mágoa com vil despeito, orgulho ferido, ou com aquilo que Lupicínio muito bem batizou de dor-de-cotovelo. Meu cotovelo anda muito bem, obrigado. E se quando escuto “quem te viu, quem te vê” me vem o desejo de que vagues eternamente no vazio angustiante de cama em cama, como Íxion girando em sua roda, sem nunca poder dizer "eu te amo" sem que teu parceiro não perceba a falsidade de tuas palavras; ou que teu fígado seja devorado milhões de vezes pelos abutres, tal qual Prometeu ( que como tal ao nascer de cada dia tuas esperanças renasçam e sejam devoradas antes mesmo do pôr-do-sol) decorre apenas do fato de que talvez eu tenha algum ascendente em escorpião, sei lá, ou simplesmente me recuse a aplaudir os anos de teatro barato que me ofereceste. Nada mais que isto..
Por favor, não me venha dizer que esta recusa em aceitar com resignação estóica teus disparates seja devido ao fato de ainda lhe guardar qualquer resquício de amor ou por pensar em alguma tola e esperançosa reconciliação. Madame, amor e ódio só caminham juntos nos estúpidos folhetins de banca de revista ou em novelas mexicanas. Meu desejo de que te afogues em suco de graviola e que ganhe mais pelo menos 5Kg entupida de chocolate, de outra forma nada tem a ver com ódio é apenas uma espinha engasgada.]
De mais a mais, como poderia odiar-te pelo simples fato de haver me descartado como laranja chupada tão logo que encontrou quem provia teu prato com comida mais farta, isto até me polpa alguns tostões? Como poderia querer teu mal se todas as vezes que estavas exposta ao relento de uma sarjeta fétida eu te dei abrigo? Se nas vezes em que te atiravam pedras como a adúltera bíblica eu te servi de escudo? Creia-me, é apenas por gostar de comédias do tipo pastelão que rio a mais não poder quando vejo que tua máscara cai em pleno palco e que teu personagem patético de menina pobre do interior; de viúva zelosa e pudica; de Madalena arrependida, não convence nem mais as moscas.
Tenho para mim que é por gostar de filmes trash de terror, daqueles que o sangue parece espirrar nas telas e que voam membros decepados para todos os lados, que tenho um prazer quase mórbido quando me vem em mente que sabes que teu lívido pescocinho repousa debaixo de uma afiada guilhotina que balança feito pêndulo e cuja corda ameaça a todo momento partir-se bastando para tanto uma leve lufada de vento ou uma brisa qualquer.Ah! maravilhosa espada de Dâmocles. E tudo isto sem que sequer minhas mão se sujem desatando o nó( como havia te prometido). Mas, que fique novamente claro, também nisto não há traço algum de ódio.
Tanto é assim, que desnecessárias estas imprecações, agora que as leio acho tão inúteis quanto supérfluas. Bastaria cantarolar a canção que Cartola fez para filha, cujos versos encerram tudo o que aqui nem precisaria ser dito. “de cada amor tu herdarás só o cinismo, quando notares estas à beira do abismo, abismo que cavaste com teus pés”. E passe mal, mas sem ressentimentos ta?!!