sexta-feira, 15 de julho de 2011

Divisão do Pará, 2º parte: aspectos formais e políticos




No dia 11 de dezembro deste ano haverá um plebiscito pelo qual a população opinará sobre o desmembramento do Estado do Pará e formação de mais dois novos Estados Membros, o Estado do Carajás e o Estado do Tapajós.

Muito se tem propagandeado acerca das vantagens sociais e sobre o desenvolvimento que experimentará as regiões do Tapajós e Carajás; que estão alijadas atualmente de políticas públicas; que são filhos enjeitados e patatipatata. Todavia, desviando-se de questões tormentosas, tem-se colocado em panos quentes alguns aspectos formais e políticos deste processo de desmembramento, como se a vontade do bloco separatista fosse o único fator decisivo à criação ou não desses novos  entes federativos.

Gostaria neste post de tratar sobre alguns desses aspectos indigestos relegados a segundo plano.

Em uma primeira análise meramente formal, podemos afirmar consoante a CF/88, art.18, § 3º, que são requisitos deste processo: 1) aprovação da população diretamente interessada por meio de Plebiscito; 2) a aprovação do Congresso Nacional por meio de Lei complementar. Analisado o § 3º em conjunto com o § 4, cujo conteúdo trata da formação dos municípios, não há qualquer absurdo em acrescentar a esses requisitos mais o estudo de viabilidade sócio- econômica.

No que se trata da aprovação da população diretamente " interessada", a CF/88 não deixou tão claro assim, quem exatamente seria esta tal população. Na hipótese em tela, diferente do que perfilhava os separatistas, o TSE determinou que população interessada deveria  compreender toda a população do Estado do Pará conforme prevê a Lei 9.709, de 1998. Interessante notar que no final das contas, caso haja o fracionamento do Estado e decorrente criação de mais dois, os Estados do Tapajós e Carajás, quem pagará o preço arcando com as despesas do banquete é a União, ou melhor, todos nós brasileiros contribuintes.

Calcula-se que o governo federal terá que desembolsar R$ 4,2 bilhões por ano para cobrir as despesas de Carajás e Tapajós. Tão-só a realização do Plebiscito custará  5,5 milhões de reais aos cofres públicos. É, rapadura é doce mas  não é mole, não.

Não à-toa a PEC nº 47/2007, aprovada este ano na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, pretende mudar esta orientação determinando que nesta espécie de Plebiscito toda a população nacional seja chamada a manifestar seu voto.

Nesta mesma esteira foi que o Senador Eduardo Suplicy representado pelo jurista Dalmo de Abreu Dalari ajuizou no TSE hoje, dia 14 de julho, ação que reivindica a todos os brasileiros o direito de votar no dia 11 de dezembro. Segundo o Senador  "Para criação de novas unidades políticas é necessário, jurídico e justo ouvir toda a população interessada. Não há na lei nada que diga que tem de se ouvir apenas a população do estado. A criação de novos estados afeta os direitos políticos de todo o povo brasileiro, além de criar um ônus financeiro que também será arcado por todo o povo brasileiro”. 

Particularmente, observado apenas o rigor técnico, não comungo desta interpretação elástica que se  pretende emprestar ao dispositivo constitucional que trata do assunto, uma vez que a população nacional embora pague a conta terá apenas um interesse "indireto". Lembremos que não existe palavras inúteis na Constituição.

Sem embargo a isto, creio que seria uma escolha mais legitimamente acertada se este tipo de decisão fosse realizada apenas pelos naturais do próprio Estado do Pará. Contra esse argumento os separatistas afirmam que, independente da  naturalidade, também contribuem com a arrecadação de impostos do Estado é por essa razão tem toda legitimidade o seu voto. Naturalmente que, entre um plebiscito votado por naturais de outros estados da federação que moram no Pará e outro por toda a população nacional, julgo sobremaneira mais justo o segundo, uma vez que também eles contribuirão para a "vaquinha". 

Um outro ponto que se tem esquecido de mencionar, talvez levianamente, é a aprovação do Congresso Nacional. Digo levianamente pois esta aprovação, como ato político, é discricionário, ou seja a depender apenas da conveniência e oportunidade dos membros da casa. Aqui a meu ver reside um ponto que tem sido tergiversado em toda discussão sobre este tema espinhoso. " Aprovada a divisão em Plebiscito o Congresso estará obrigado a aprovar por meio de Lei Complementar ? "

Antes de enfrentar propriamente o assunto, gostaria de tratar de outro tema consentâneo à divisão: a representatividade política das regiões no Congresso Nacional. O sistema representativo insculpido na CF,  foi criado para  Estados mais populosos como São Paulo elejam no máximo 70 Deputados Federais, e Estados menos populosos 8 Deputados Federais, cada. O senado, como representa os Estados e não a população elege, segundo esse sistema, 3 Senadores cada.

Pois bem, não é preciso ser nenhum gênio para perceber que o sistema atual da CF/88 acaba   por prejudicar Estados mais populosos, cuja representação se levássemos em conta apenas a proporcionalidade numérica populacional, seria bem maior.

Com a criação de mais dois novos Estados na Região Norte esta disparidade se acentuaria. Pra começar, com 9 estados, ou seja, com 27 Senadores, a Região Norte se igualaria a Nordeste em numero de Senadores, sendo que cada Senador nortista representaria em torno 600 mil pessoas, menos de um terço da representatividade de um senador nordestino.

Doutra banda, pensemos em Regiões como o Centro-Oeste. Com a divisão a bancada do Norte somaria 72 deputados federais. Teria assim 76% a mais de cadeiras (31 vagas) do que esta região, sendo que sua população não chega a ser 13% maior do que o Centro-Oeste.

Todos sabem onde aperta o sapato, com o Congresso esta regra não funciona diferente. Será que há interesse no desmembramento do Estado do Pará a justificar uma aprovação da casa caso haja uma aprovação plebiscitária no dia 11 de dezembro? Se houver, será que há interesse cujo quorum represente a maioria absoluta, quorum de Lei Complementar?


Pergunta interessante é caso haja uma divisão como se fará para compatibilizar  mais 16 deputados com a regra prevista na lei complementar de 1993 que diz que a Câmara pode ter, no máximo, 513 deputados?

Já se foi dito que o Congresso respeitará a decisão do Plebiscito caso seja ela "expressiva". Venhamos e convenhamos, mesmo que essa vitória expressiva digna de almirante suíço  venha a acontecer, (Até agora duas pesquisas foram feitas, IBOP, 64%, não, 27% sim, e VOX POPULI, 42% não, 37% sim) não podemos esquecer a pressão da opinião pública nacional, que não se conformará em esvaziar os bolsos assim tão generosamente como bons  samaritanos.

O fato é que aqueles que esperam uma futura divisão do Pará para engordar seu gado estão a esperar sapato de defunto.

 Então a pergunta que não quer calar, a quem interessa essa divisão? Não temo de pronto  em responder : à corrupção, ao clientelismo político, ao desmatamento desregrado, à violência agrária.

Por último, mas não menos importante, é o estudo de viabilidade que até esta data não ocorreu, pelo menos um estudo mais atual.  É certo que o § 3º não tratou especificamente da viabilidade para a formação de novos Estados, mas somente à criação de novos Municípios. Todavia é forçoso concluir, que se é necessário para a formação de novos municípios, com muita mais razão deve-se utilizar para a formação dos Estados, composto que são de vários Municípios.

Para garantir esse pressuposto o Deputado Estadual Celso Sabino chegou a impetrar Mandado de Segurança perante o STF para impedir a realização do Plebiscito, argumentando que antes deveria ser realizado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicadas )  o estudo de viabilidade sócio-econômica que orientasse as populações envolvidas.

Neste ponto é que o discurso se aproxima mais ainda do realismo fantástico, porque muito embora não tenha sido realizado este estudo atualizado, os interessados na divisão têm puxado a sardinha para o seu prato e veiculado informações levianamente favoráveis a si próprios. Auxiliados pelo marketeiro Duda Mendonça, nelas os Estados do Tapajós e Carajás são mostrados como promissoras futuras unidades da Federação. 

Curioso é que o mesmo Duda Mendonça em tempos idos lutou contra a divisão de seu Estado natal, a Bahia. Mais curioso ainda é o fato de ele ser atualmente criador de gado no sudeste do Estado.

Mas uma coisa é certa, não adianta tentar sentar cachorro em banco, porque o rabo não deixa. Conquanto os futuros Estados levem Belo Monte e as minas de Carajás deixando o Estado mãe a ver navios, estão longe de possuir toda esta auspiciosidade que pretendem ostentar. 

Cumpre esclarecer desde já que a realidade é bem menos bonita do que quer fazer crer a turba sectarista, cuja ganância e falácia não teme em manipular as massas e lança-las em uma luta inglória e temerária. Curioso que vez por outra usem o exemplo do Estado de Tocantins para justificar uma possível divisão. Chega a ser emblemática esta comparação, uma vez que o Estado é o 4º mais pobre do Brasil. 

A bem da verdade o estudo de viabilidade sócio-econômica já foi realizado pelo IPEA em outros tempos (2008). Este estudo ficou conhecido como estudo Boeuri. O que ficou manifestamente demonstrado neste estudo? O óbvio ululante: que nenhum dos futuros Estados são viáveis.

Seria como adolescentes que querem sair de casa e continuar bancados pela mesada dos pais.

Segundo o estudo Boeuri o Estado do Tapajós com um (PIB de 6,4 bilhões), já nasce sendo o Estado mais pobre do Brasil, perdendo apenas para a prima Roraima (PIB de 4,8). Carajás apesar de ter um pouco mais de sorte, ou l'argent mesmo (PIB de 19,6 bilhões), já nasce como o Estado mais violento do Brasil. Segundo dados do Ministério da Justiça (2008) a taxa de homicídios dolosos de Carajás seria de 68,1 assassinatos por ano para um grupo de 100 mil habitantes. Só para entender este índice, Alagoas, considerado o Estado mais violento possui (66 homicídios por 100 mil habitantes). A taxa de homicídios em Carajás seria duas vezes maior do que a do Estado de Rio de Janeiro (33 por 100 mil) e seis vezes a de São Paulo (11/100 mil). Os homicídios em Carajás também superariam Honduras, o país mais violento do mundo, que teve 58 assassinatos para 100 mil habitantes em 2008.


Se não bastasse todos esses índices o pior é que ambos os Estados gastariam um número muito elevado de seu próprio PIB para se manter (claro, isso se eles fossem se manter sozinhos e não bancados pela mamãe União). Tocantins gastaria 44% de seu PIB e Carajás 19 %.  A média dos Estados brasileiros está em 12%.

Atualmente a IDESP e a UFPA estão fazendo um estudo parecido e já adiantam alguns índices. O Pará ficaria com 56% do Produto Interno Bruto (PIB), Carajás com 33% e Tapajós com 11%.Ou seja, índice muito aproximado ao de 2008 feito pelo IPEA.


Seria cômico se não fosse trágico, mas existem mais 13 propostas de separação sem quê nem porquê transitando no Congresso. Posso até não ter a fórmula para regiões como as de Tapajós e Carajás saírem da miséria, mas uma coisa é certa: não é aumentando o número de políticos e assessores que isto vai mudar. 


Verdade seja dita. Se todo esse dinheiro gasto com a divisão fosse investido nas regiões afetadas com a divisão e se toda essa energia fosse empregada para cobrar dos políticos eleitos(também por essas regiões) o emprego adequado das verbas públicas, seria infinitamente mais produtivo a todos. O grande problema é que isso não interessa. Não interessa aos novos políticos que se elegerão representando os novos Estados; não interessa aos seus parentes que serão empregados nas futuras repartições públicas; não interessa a elite que financiará a campanha desses novos políticos, enfim...O pato é sempre o mesmo (o povo) só o que muda é o tucupi.





terça-feira, 12 de julho de 2011

Divisão do Pará 1º parte : a ocupação da Amazônia.

   
      
                Nunca esqueci de uma cena do filme "Bye, bye Brasil" dirigido por Cacá Diegues. Devia ter meus 16 ou 17 anos quando a vi.  Talvez, na época, tenha gostado tanto porque parte do filme fora rodada aqui na Região Norte. Até mesmo o palácio dos bares, um inferninho da época, foi retratado no filme. Por outro lado, como não lembrar da canção do Chico dizendo que tinha pego uma doença em Belém? Pois bem, na cena a fantástica Caravana de saltimbancos Rolidei (SIC) cruzava a transamazônica entre caboclos e arraias rumo ao Eldorado, à suposta Xangrilá amazônica,  que se chamava Altamira. "Vão para Altamira" dizia o caminhoneiro, "Lá vocês irão encontrar o paraíso e ficarão ricos".
                 Obviamente o filme nunca passou de uma obra de ficção, até porque Altamira sempre esteve muito longe de ser o paraíso, mas de certa forma, representa muito bem como foi a ocupação da Amazônia. 
                   A primeira fase da ocupação da Amazônia podemos chamar de a tentativa . Logo no início não foi tão fácil vender a Amazônia assim como tirar bala de criança. A promoção praticamente se deu a preço de custo, afinal, era época da guerra e a empresa estava apenas no começo. Seus produtos sequer haviam alcançado boa cotação no mercado. Um em particular parecia agradar aos patrões acionistas diretores lá do Tio Sam. E lá foram tantos bravos arigós, soldados da borracha empunhando suas facas de seringa. Marchando contra o terceiro reich e seu Führer; marchando para guerra; marchando para a morte no inferno verde; marchando para o descaso e para o esquecimento. As más línguas dizem até que morreram afogados, pouco acostumados que estavam com tanta água.
                  A segunda fase se deu anos mais tarde quando os milicas, não satisfeitos em vender a economia para os gringos e para o FMI, resolveram descolar mais um troco loteando a Amazônia.  Chamaremos de a grande promoção. Aos quatro cantos seus marketeiros divulgaram sua campanha publicitária. "Integrar para não entregar" era o slogan da propaganda viral. Nem precisa dizer que dessa vez a promoção foi um sucesso. Vendeu mais que churrasquinho de gato em dia de RE X PA.
                   Aceitava-se qualquer cartão; parcelava-se em até 62 duas vezes; podia-se comprar por uma pechincha no Groupon e Peixe Urbano; Gol e Tam nem cobravam a passagem de ida.
                Aos poucos a "ordem e progresso" foi finalmente chegando àquela região tão inóspita e selvagem. Campos e mais campos de floresta iguais a centenas de milhares de Maracanãs deram lugar às plantações de soja ou à agropecuária; toneladas e mais toneladas de madeira puderam ser industrialmente aproveitadas; estradas abertas entre as matas; nosso minério finalmente pode ser adequadamente explorado e mandado ao exterior.; finalmente aparecemos na mídia como no assassinato da irmã Dorothty e no massacre de Eldorado. Era o milagre na "terra sem homens"
                Agora finalmente chegamos ao ápice, a terceira fase: o grande prêmio. Ora, depois de lotearem e venderem a preço de banana só resta uma coisa a ser feita para se completar a venda : passar a escritura para o nome dos novos ocupantes.  "Para vigo me voy" será que ainda cabe mais um saltimbanco na caravana Rolidei????????