Esta
semana, Dias Toffoli Ministro do STF referiu-se às penas restritivas de
liberdade aplicadas ao núcleo financeiro do mensalão como dignas do período
medieval, uma vez que os crimes praticados pelos réus, quais sejam: quadrilha,
lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, etc. não seriam crimes assim tão
graves, cuja periculosidade autorizasse tão perniciosa segregação.
A bem
da verdade o ministro Toffoli, ex advogado do PT e ex assessor de José Dirceu
na Casa Civil, apenas endossou a frase infeliz proferida dias antes pelo atual
Ministro da Justiça, Eduardo Cardoso. Dizia o Ministro que seria preferível
morrer a ir para a cadeia no Brasil, em clara alusão as penas de prisão
aplicadas a José Dirceu, dentre outros réus envolvidos na ação penal nº 470.
Confesso
que tão logo tais declarações ganharam a mídia, algumas questões me causaram
perplexa curiosidade, como para que serve a pena de prisão no Brasil? Para o
Ministro do STF, quem deveria ir para cadeia? E por último, por que diabos as
mazelas do sistema carcerário só estão sendo discutidas agora ?
Pra
começo de conversa creio que seja claro para todos a falência do sistema
carcerário brasileiro. Nisto andou muito bem o Ministro Eduardo Cardoso quando
comparou a penitenciária brasileira a uma verdadeira masmorra. Com efeito, a
lei mais desrespeitada no Brasil é sem duvidas a Lei de Execuções Penais.
Presídios superlotados, direitos civis a torto e a direito suprimidos. O
encarcerado é um quase-cidadão dentro da lógica mesquinha das estruturas de
poder brasileiras. Conquanto isto seja verdade inconteste, o que não ficou
muito claro em minha cabeça é: se o Ministro Eduardo Cardoso é Ministro
da Justiça, portanto, autoridade competente para promover a mudança do sistema
penitenciário , por que até agora não o fez ? Certamente porque preso não vota.
Mas
deixemos de lado por hora o Ministro da Justiça do governo do PT para tentarmos
compreender o inflamado aparte do Ministro Toffoli, cuja companheira, advogada,
fez a sustentação oral em 2007, defendendo alguns desses mesmo réus.
Ora, a
primeira conclusão imperiosa a que temos que chegar analisando suas declarações
é a de que, segundo o Ministro Toffoli a prisão é coisa, como ele mesmo disse,
medieval, e esta coisa medieval serviria apenas para impedir delinquentes
perigosos de cometer novos delitos. Delinquentes perigosos, segundo a cartilha
do Ministros são aqueles que praticaram “crimes de sangue”, ou seja, o
assaltante de banco; o homicida; o trombadinha.
Os três “ps” : preto, pobre e puta.
Não duvido
que se estivesse na Roma antiga o Ministro concluiria “aqueles que não
são da minha estirpe. Os que não gozam como eu da cidadania romana
No afã
de defender tão odiosa tese, citou até Michel Foucault e usou como exemplo a
banqueira mensaleira Kátia Rabello. “Que perigo pode causar uma bailarina ?”
indagou indignado.
Não,
Sr. Ministro, por mais que isso lhe cause estranheza, a pena de prisão não
lembra em absoluto as ordálias e penas medievais, tais como empalamento,
crucifixão, enforcamento, tortura, fogueira. Bastaria ler a introdução do livro
Vigiar e Punir, de Foucault, aquele que V.Exa nos sugere ter lido, para
perceber o quão distante da realidade histórica estão suas tendenciosas
conclusões. A bem da verdade, a pena de prisão, à época, representou grande avanço
na aplicação das penas, uma conquista do pensamento iluminista.
Por
outro lado, não consigo encontrar outro adjetivo senão “vergonhoso” para
definir sua citação de Foucault , a qual supostamente justificaria a
ausência da pena prisão para este tipo de delinquência.
Bastaria
uma leitura um pouco menos superficial da obra do filósofo para compreender que
o que ele criticava não era exatamente a pena de prisão, mas a utilização do cárcere como forma de controle social impingido pela máquina punitiva estatal,
ou seja, a segregação seletiva e higienizante, exatamente nos moldes defendidos
por V.Exa : cadeia para pobre, preto e puta.
Em um
Estado Democrático de Direito, Sr. Ministro, o cárcere foi reservado para os
pretos, pobres e putas, mas também para os ex-guerrilheiros e para as
bailarinas fora-da-lei. E por que nao dizer? Até
para os magistrados, uma vez que também estes praticam crime de prevaricação
quando demonstrada a sua tendenciosa parcialidade no processo.
Se é
fato que a democracia brasileira de tão incipiente ainda engatinha. Oxalá
chegue o dia em que ela alcançará a maioridade. Neste dia, nossas cadeias, como nunca antes na história deste País, abrirão vagas até para
ex-presidentes.